Como de Stanley Kubrick, não se pode esperar nada menos que genial, ele não nos decepciona em mais um filme de guerra, na sua pouco extensa filmografia que consagra sua brilhante carreira de quase 50 anos como cineasta. Conhecido por ser extremamente exigente e perfeccionista, Kubrick sabia muito bem o que queria e como alcançar o que buscava em seus filmes, o que demandava um árduo trabalho, tanto de sua equipe técnica quanto de seus atores. Mas se Stanley Kubrick, era famoso por seu estilo de filmar, não se pode dizer o mesmo quanto ao seu estilo de filme. Kubrick brilhou, em diversos gêneros cinematográficos, drama, suspense, romance, guerra, ficção científica, ação, aventura e tantos outros, sempre com a mesma competência.
“Nascido Para Matar” (Full Metal Jacket), de 1987, o penúltimo filme do diretor, não é apenas um filme de guerra, é uma crítica a ela. Logo no início do filme, acompanhamos uma longa seqüência, bem ao estilo do mestre, em que vários rapazes têm suas cabeças raspadas, e nos deparamos com o primeiro choque da guerra, a perda da identidade. Identidade essa, readquirida posteriormente, através de humilhantes denominações, atribuídas aos rapazes pelo nada gentil Sargento Hartmann (R. Lee Ermey). As humilhações verbais acabam tornando-se brandas após o exaustivo treinamento e as nada éticas lições discorridas pelo fascista, machista e intolerante Sargento Hartmann, o que nos leva a segunda evidência da guerra, a alienação.
Aos poucos acompanhamos a transformação dos garotos em máquinas de guerra. Nem mesmo os que se mostram mais destemidos frente ao cruel treinamento, são reconhecidos ou menos humilhados. Como é o caso do recruta Joker (Matthew Modine) ou do inteligente recruta Cowboy (Arliss Howard). O que dirá o gorducho e medroso recruta Pyle (Vincent D'Onofrio), suas trapalhadas eram o principal motivo do constante desgosto do Sargento Hartmann, o que por sua vez, prejudicava o pelotão inteiro. E quando finalmente consegue destacar-se em alguma coisa, já era tarde de mais, a mente fraca do rapaz já tinha cedido aos infortúnios da guerra.
No segundo momento do filme a guerra começa de fato para quem sobrevive ao impiedoso treinamento para tornar-se um fuzileiro naval. E a guerra, todos dizem, é a do Vietnã, mas que diferença isso faz? Kubrick, mais uma vez é brilhante, pois não dá rosto ao inimigo, podendo essa, ser qualquer guerra, isso é indiferente na obra. Desde o começo esses jovens rapazes já foram derrotados, seja pelo estado, que prega o patriotismo e o amor à nação, mas é indiferente as precárias condições de vida de seus combatentes, ou pelo horror do treinamento que não ensina a morrer por um ideal que eles mesmos desconhecem, só a matar por prazer um inimigo cujo o único erro tenha sido nascer em um país que está em guerra contra os EUA .Esses rapazes já não são os mesmo da cena inicial do filme, e jamais voltarão a ser e assim acabam por tornarem-se seus próprios inimigos.
Utilizando-se de locações reais, as ruínas que são o plano de fundo das batalhas, não são cenográficas, Kubrick nos apresenta a guerra, como ela é de fato, sem engrandecer o nacionalismo americano, sem o patriotismo exacerbado corriqueiro em filmes do gênero. Entre tantas contradições que ironizam a própria guerra, como Joker, que usa um botton da paz no peito e um capacete onde se lê “Born to Kill”, que acabou intitulando a obra, quando esta foi traduzida para o português, ao invés do nome original “Full Metal Jacket” que faz referência ao tipo de munição usada no Vietnã, em que o projétil é revestido por chumbo. Há ainda a figura da mulher, que na hora da morte, reza, após ser tão subjugada durante todo filme, revela-se como a inesperada algoz do mesmo. E entre tantas perdas físicas, psicológicas, emocionais, ao fim da guerra fica a pergunta: Quem perdeu menos?
Salma Nogueira.
Adorei o post, como também adoro o filme e o diretor. Kubric é simplesmente genial e tem algo que acho essencial: identidade, originalidade. Sempre consegue impor sua marca de diferentes formas nos diversos gêneros com os quis flertou. Em "Nascido para matar" ele não economiza no tom irônico, o que acho que o distancia da grade maioria dos filmes de guerra, vocês não concordam? Parbéns pelo espaço, Salma. Nos encontraremos mais vezes aqui, no circuito alternativo, ou quem sabe no meu blog... Até mais!
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